PARAÍSO PERDIDO
Éramos duas crianças
descuidadas.
Éramos duas flores nascidas num
jardim,
ao lado uma da outra, tão perto
uma da outra,
que confundiam seus perfumes,
sua cor, suas raízes.
Éramos ... Mas sei lá bem o que
nós éramos !
Sei lá eu se em verdade fomos o
que fomos !
Raiz,
perfume, cor,
já só existem na dor de querer
em vão lembrá-los.
E no entanto, Amor, o que fomos
nós ?
Esta angústia, vaga mas
persistente, a que devemos ? ...
Deus fugiu-nos, não fomos nós
que Lhe fugimos,
mas não deixámos nunca de
rezar-Lhe nem de acatar Seu nome.
Quase que não saímos do
jardim.
Não matámos, não dissemos mal
dos outros,
Eu declinei convites que Deus
me proibia ...
Simplesmente, ao amar-te pensei
no nosso Amor.
Vi no Amor uma fonte de alegria
– não de tristezas.
Acreditei que teus lábios eram
frutos
que eu devia trincar antes de
amadurecerem ...
Amei com a mesma ternura o teu
corpo e a tua alma.
Amei-te, flor !, raiz e caule e
pétalas e folhas,
tão carinhosamente, tão
religiosamente,
como amei teu perfume.
Mas hoje, inexplicável, oiço em
tudo
uma tremenda acusação : o azul
das ondas
a meiguice infantil das
miosótis
o céu balsâmico, as cariciosas
nuvens,
tudo que é meigo, azul,
caricioso, balsâmico
só por hábito o sinto ainda
assim. E tudo me pergunta :
« Que é de ti ? Que
fizeste
do que olhava para nós
enternecidamente"?"
Vou-te amando por hábito
!
Mas a continuando a parecer
deslumbrado e sincero.
E o mais triste é que chego a
acreditar em mim,
e o mais irónico é que todos me
gabam e me invejam.
Pudesse eu regressar ... Mas
como,
Se quase não saí de onde estava
?
Pudesse (mas como não pequei
?)
não voltar a pecar,
e novamente ser a flor ingénua
do jardim ...
Ou será, minha vida
maravilhosamente apaixonada
por tudo quanto é belo, será
que o teu destino frutos que são teus
e torturada olhar de longe a
água que mereces ?
Ah !, se o Amor me é vedado
como preço de amar ardentemente,
de comovidamente olhar, ouvir,
sentir , cantar,
abençoada angustia !
Levem a água para longe dos
meus lábios.
E pareçam meus lábios, eles que
não beberam água puríssima intacta ;
levem para bem longe das minhas
mãos os frutos
- e que pareçam elas frutos
sempre maduros e magníficos
que nem a mão dos Homens nem a
foice do Tempo maltrataram.
(Sebastião da Gama )
Como pode Deus castigar este homem, Sebastião da Gama, que era a imagem pura do Amor, tirando-lhe a vida quase que ainda menino??
ResponderEliminarTanto ficou por dizer, por fazer, por dar ao Mundo!!