quinta-feira, 25 de setembro de 2014

ALEGORIA



Alegoria
Poema de Sebastião da Gama

Junto do Mar canta a Cigarra.
Canta, p´ra iludir ...
a fome e a solidão ;
p'ra fingir que tem pão
e p´ra fingir que está acompanhada .

Tremeluzem os Astros no céu nítido :
Dona Cigarra faz serão.
Como há-de ela dormir, se a vida e curta ?
-- : Cigarra que se presa , quando morre
não deve estar a meio da canção .

Ninguém pára a saber por que é que canta.
Ninguém lhe dá ouvidos nem conforto .
Melhor, , assim : assim , não perde tempo
quem não pode cantar depois de morto.
A parte que lhe coube por destino,
tem de morrer deixando-a já cantada .
Que faz que a não escutem nem lhe acudam ?
É preciso é sentir que se está vivo .
É preciso é que asas que sosseguem
o tenham merecido .

Canta a Cigarra à sombra da montanha
e à sua voz a solidão alastra ,
deixa-a mais longe , sempre , dos que dormem.
Só a noite a entende e agasalha.
Mas a voz não acusa nem se cansa
nem laiva de azedume ou amargura.

Ei-la crucificada de indiferença .
Serve-lhe a Noite de mortalha .
Morno ainda do Canto,
seu coração evola-se em ternura
que vai poisar no sonho dos que dormem ...
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